A Gaja

Eu gosto do teu jeitinho cabrão, gosto do teu andar gingão. Eu gosto do teu sotaque de vinho carrascão. Deixa-me estar, deixa-me ficar, eu prometo ficar quieta. Queda, aqui, me fico, a ver-te passar. E os teus olhos, e tu, que és? A tua voz de vinil, 37 rotações, roça na pele. Toca-me. 

Entediada com a ausência de um bom exemplar masculino para contemplar. Apenas para exercer a arte de bem contemplar.

Olá! Bem-vindo à minha casa e à minha vida! Quero dar-te tudo e no menor tempo possível! Rápido, que a vida é para ser vivida, não temos nada a perder e eu até já programei a box para gravar todos os episódios dos The Kennedys. Senta-te, por favor, não faças cerimónias! Sim, pode-se fumar, claro! Não sou fundamentalista! Hmm, usa antes esse cinzeiro, que este foi um presente da minha 'ex' numa viagem que fizemos a Marrocos. Mas fuma, estás à vontade! Adoro cozinhar, descontrai-me imenso! Não gostas de cozinha de fusão? Mas isto é só um chutney de manga com teryaki de atum! Vá, vais provar e vais adorar, a sério! Fiz um workshop de culinária fabuloso... recomendado pela Time Out, foi o máximo. Não exageres... também não são assim tantos DVD... gosto de ir à FNAC de vez em quando... perco a cabeça, é verdade... adoro os clássicos! Fellini, Pasolini, Marco Bellini, Paganini, Panini...Adoro, adoro! O meu filme favorito é aquele, a preto e branco, daquele sueco... ai... não me re...

"Está a ficar tarde..." "Só mais um copo, vá!" "A sério..não me apetece beber mais. Além disso, já viste as horas?" "E então?" E então?! E então nada. E então eu quero que tu te fodas. Não, não me apetece beber mais. Não, não me apetecer dançar. Não me apetece ser fixe, não me apetece cheirar nada, nem fumar. Não me apetece fingir que me importo e ter que fazer todas estas perguntas. E porque é que temos que falar, e porque é que isto é tudo tão difícil... e porquê e porquê e porquê... "Há coisas mais importantes!". Claro que há. A troika e o truca-truca, a estranha tesão que o Vítor Gaspar me dá quando anuncia mais cortes e aumentos de impostos (deve ser o ar de serial killer  que me dá ponta), as primaveras árabes, estreias de filmes europeus interessantíssimos que nunca irei ver, aquele novo livro que está a deixar toda a gente maluca, a banda do momento. Quero lá saber. Porquê é que havia de querer? Eu quero ficar aqui. Parada...

Eu tenho muito orgulho em afirmar que criei este blogue antes do país ser lixo.

Quero os teus olhos. Quero os teus olhos. Quero. Os teus olhos.

Eu tentei. Tentei ser a amiga, a amante, a confidente. Tentei ter a graça que não tinha, rir-me de piadas às quais não achava graça. Tentei ser mais alta, mas baixa, mas magra. Tentei ser a freak, a beta, a radical, a conservadora. Tentei ser tudo e nada deu certo. Tentei agradar-te (a ti, em particular, e a todos os filhos da puta co-dependentes como tu), ser o teu ombro amigo. Ouvir-te falar da outra, das outras, escutar como se falasses do tempo. E não era o tempo. Não era nada. E o nada ali, deitado ao teu lado, era eu. Por tua causa (não, não és só tu, foram tantos como tu), por minha causa, eu já não sei. Ou sei...Sei que já não quero nada disto. Sei que aquela não era eu. Eu não sou aquilo. Eu não sou assim. Eu não estou disponível. Eu não quero saber dos teus dramas interiores. Eu não te vou salvar, não te vou ajudar, nem vou lá estar quando precisares de mim. Não vou atender telefones, não vou mudar de penteado. Eu já não vou ser nada. Eu não quero ser nada para ninguém. Eu qu...