O que é o Natal?

Há uma criança a caminho,a primeira na família em quase duas décadas. Enquanto esse novo ser não irrompe nas nossas vidas (natividade tardia), entretenho-me observando a contagem decrescente até ao dia 25. Pinheiros metálicos iluminados à custa do generoso patrocínio de empresas, montras recheadas de trapos, gadgets e quejandos, promoções e promessas de um Natal mais "económico", "fantástico", "luxuoso", "a prestações", "sem juros". Fala-se de "crise" (palavra puta, anda nas mãos, bocas e bolsos de toda a gente). O seu fantasma paira, pesado e bafiento, como uma doença crónica que atrofia os músculos e entorpece o pensamento. Os que a debatem acaloradamente nas mesas dos cafés, enquanto sorvem a bica, são os mesmos que, nas filas do shopping, mordem os lábios e franzem o sobrolho a cada "bip bip" da registadora. Depois de, atordoados, verificarem o valor total correspondente ao amontoado de Barbies, Playstations, Polly Pockets, telemóveis, DVD e afins, puxarão do cartão de crédito para ser degolado até ao limite pelo leitor electrónico.
Quantos meses demorarei a pagar isto?, Será que era mesmo aquele jogo que os miúdos pediram?, Devia ter sido intransigente com os pedidos. Eles não precisam de tanta coisa!, Tenho vergonha de chegar a casa dos meus sogros e ver que os meus sobrinhos receberam mais presentes que os meus filhos..., Como é que vou pagar a prestação do carro em Janeiro?
Da minha posição favorável e arrogante de jovem adulta, trabalhadora, sem grandes encargos económicos, interrogo-me como é que conseguirão dormir descansados. Como é que conseguem sentar-se à mesa da consoada sem um aperto de culpa na alma. Um vazio.
Após anos de ateísmo rebelde, comecei a fazer as pazes com a minha educação católica e a procurar resquícios dessa aprendizagem para, com esforço, os transformar em algo de válido para a minha vida. Quem foi Cristo? Uma miscelânea de crenças pagãs (ver o documentário "Zeitgeist", muito esclarecedor), um mito, uma efabulação cuidadosamente elaborada pelo mais antigo partido político do mundo, o primeiro comunista, um louco?
Questionar é preciso e saudável, querer encontrar uma resposta única e absoluta é redutor e estúpido. Sei que o seu nascimento é o eixo que rege a nossa existência enquanto civilização. Sei que a essência da sua doutrina é a proposta mais radical de Amor, Compaixão e Paz. Mas não sei se esses princípios serão sequer lembrados momento de desembrulhar os presentes.
Invade-me um sentimento de profunda repulsa perante a ideia de "fazer compras natalícias". Não me sinto capaz e tenho vergonha. Deveria forçar-me a fazê-lo, porque só assim conseguirei demonstrar o meu apreço e amor pelos que me rodeiam. Mas não consigo. Gostava que a minha presença fosse suficiente. Gostava que, se segundas intenções, nos sentássemos à mesa, trocando histórias, comendo, bebendo e rindo. Gostava que isso bastasse.

Quando a nossa menina nascer, sei que a encheremos de presentes. Com gosto e orgulho. Mas também sei que, no próximo Natal, a sua presença bastará para que a noite seja mágica. O primeiro de muitos Natáis.

Comentários

Anónimo disse…
Vai comer couves, beber aguardente e fumar cigarrilhas com a tua avó (ou a minha, como quiseres)!!!!!
Stranger disse…
...tas uma autêntica maluca
MM disse…
A ideia das cigarrilhas parece-me engraçada:P Se bem que acho que a nossa avó não acha-se particular piada à ideia.

Olha eu tb ainda não fiz compras de Natal nem comprei nada para a miúda, tenho que te pedir umas dicas:P

Mas olha, o que vai reconfortando a alma é que na falta daquele que já partiu, este ano há uma nova presença (se bem que dentro da barriga) :D

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